Blomia Tropicalis
Setembro 17, 2008
O QUE VEM ANTES? Perguntou-se Helena, na frente do ecrã do laptop que o marido lhe oferecera para poder trabalhar em casa e onde se dispunha a passar parte dos seus dias, exercendo o supremo direito da vingança que é o que fazem todos os bons jornalistas de meia idade, após terem acumulado os ódios de estimação necessários a qualquer existência sadia.
O que vem antes? A história, ou o título?
Nos primeiros anos de jornalismo, era quase sempre chamada para dar o título às matérias. Depois, ao longo dos tempos, nas redações, os colegas continuaram a gostar dos títulos extravagantes que engendrava, para os textos imberbes dos que ainda não tinham carteira do sindicato, nem se permitiam usar a barba que distinguia um jornalista em inicio de carreira e com vontade de se ater apenas ao reportar fino e frio dos factos, de um grande repórter. Ou de um advogado canalha, ou de um economista neo-liberal... Esses sim, seres bem ataviados e principalmente sem medo do sucesso entre mulheres escritoras, advogadas, atrizes de Tchekhov, editoras, enfermeiras, médicas, faxineiras e demais marafonas giras.
Helena sentia-se nostálgica porque acabava de receber a notícia da morte de seu tio-avô Alberto Barata Ribeiro e via-se entrando, pela mão dele, na redacção do Jornal Livre, onde anos mais tarde escreveria a sua primeira notícia – uma breve sobre um acontecimento sem importância, em Lisboa, que lhe levara o dia inteiro a redigir e lhe valera um puxão de orelhas protetor do editor, um advérbio de modo acentuado...
Quando ela só tinha sete anos e usava laços nos cabelos e depois, ao longo da vida, os homens sempre tinham essa vontade de a proteger que a deixava sem pica, ou sem vontade de fazer subir a temperatura de alguns encontros mais ou menos secretos, como o daquela noite em que Pedro a convidara para comer um bife, após o fecho da edição e os dois se beijaram e deram as mãos, sentados nos sofás pejados de Blomia Tropicalis do Snob.